Como começou, como terminou, campinhos e guerra
28 março 19:14
Paulo César Carpegiani Flamengo 2018
Sem Carpegiani, Flamengo de Bandeira vai buscar o 13º técnico em cinco anos
29 março 17:07

Botafogo encontra equilíbrio e despacha um Flamengo mergulhado no completo caos

Luiz Fernando cheirinho Botafogo Carioca 2018

(Twitter / Botafogo)

Luiz Fernando cheirinho Botafogo Carioca 2018

(Twitter / Botafogo)

Em pouco menos de dois meses, o mundo da bola girou para Flamengo e Botafogo. É característica inerente ao futebol brasileiro: a incrível irregularidade entre times que permite um igualar na balança mesmo com tanta disparidade fora de campo. Na semifinal da Taça Guanabara, os dois times se enfrentaram e os rubro-negros conseguiram impôr seu poderio financeiro nas quatro linhas. No reencontro em um clássico decisivo, caos e equilíbrio trocaram de lugares. O Flamengo que parecia ter um caminho estruturado a seguir em 2018 mergulhou em uma desorganização. O Botafogo, que três dias antes foi atropelado pelo Fluminense na final da Taça Rio, encontrou um ponto de equilíbrio e com uma magra vitória de 1 a 0 avançou à final do Campeonato Carioca.

Não há mágica no trabalho de Alberto Valentim. Houve, sim, um simples olhar no espelho para constatar o que tinha em mãos. Ao iniciar o trabalho no Botafogo, o técnico tentou manter sua pegada mais agressiva dos tempos de Palmeiras. Uma equipe mais avançada, buscando agredir os rivais. A pancada de 3 a 0 diante do Fluminense serviu de lição. Alberto Valentim admitiu as limitações de seu elenco e mudou sua ideia. Em vez de um time aberto, espaçado e buscando toque de bola com saídas rápidas no 4-2-3-1, um mais fechado, mantendo a formação ao atacar, mas enclausurando-se em um 4-5-1 ao defender. E duas mudanças bem sacadas: Carli na vaga de Marcelo Benevenuto, Renatinho no lugar de Marcos Vinícius.

Fla no início: Arão correndo sem sentido e laterais adiantados

O defensor argentino dá personalidade ao time – não foram raras as vezes que, dedo em riste, indicou a melhor saída de bola para companheiros – e maior competência na bola aérea com sua estatura. Foram 13 rebatidas de Carli, de acordo com o Footstats. Mais lento, o zagueirão não pode jogar adiantado. Demoraria uma eternidade para recuar e acompanhar velocistas do ataque rubro-negro. Valentim se adaptou ao que tem. Renatinho, no meio, deu maior combate do que Marcos Vinícius e toques mais curtos, buscando tabelas para, enfim, abrir passagem aos laterais, Marcinho e Moisés, em grande noite. É daquelas ironias.

Milionário, recheado de peças fortes no elenco, o Flamengo peca justamente pelos lados do campo. Paulo César Carpegiani decidiu trocar os laterais. Pará voltou ao time, Everton foi efetivado na esquerda. Renê acabou barrado e Trauco nem mesmo voltou dos amistosos com a seleção peruana. No meio, outra mudança de impacto: Everton Ribeiro caminhou para o banco e Willian Arão retornou aos titulares. Desde o início, o camisa 5 foi responsável por deixar o time um tanto quanto dúbio. Seria o mesmo 4-1-4-1 com Arão mais à frente ou o velho 4-2-3-1 dos últimos dois anos? O volante voltava para iniciar a jogada, mas era visto com frequência correndo em disparada para infiltrar na área botafoguense. Ao parecer tentar emular ambos, o Flamengo ficou dividido.

Botafogo no início: time mais fechado, buscando as saídas laterais

Vinicius Junior completou o pacote de mudanças de Carpegiani, que causou estranheza. Foram nada menos do que 14 jogos na competição anteriores ao clássico que decidiria vaga na final. Houve tempo para testes. Mas eles foram feitos justamente nesta quarta-feira. O time não andou. Pouco criativo. Lucas Paquetá, geralmente o ponto de lucidez, estava mal pela ponta esquerda e pouco melhorou ao trocar de lugar com Vinicius Junior em alguns momentos, embora tenha parecido à revelia de Carpegiani. Mas, desorganizado, o Flamengo avançava. Everton ia à frente e abria espaço para as investidas de Luiz Fernando ou Marcinho às suas costas. No outro lado, Moisés acompanhava bem Vinicius Junior e caminhava por todo o espaço quando Pará avançava ou tentava acompanhar Leo Valencia, que buscava o meio.

O Flamengo, de fato, pouco ameaçou Jefferson. Uma cabeçada próxima ao gol de Willian Arão em escanteio aqui, outra cabeçada de Rever jogada pelo goleiro a escanteio ali. Diego, de forma inexplicável, deu um soco em Carli dentro da área em um cruzamento, cometendo pênalti claro ignorado pelo árbitro Marcelo de Lima Henrique. O time rubro-negro, sem criatividade, não era apático como no Fla-Flu da semifinal da Taça Rio. Corria, mas de forma errada. O Botafogo também corria, mas organizado. Com tanto espaço diante do rival avançado, o Botafogo trocou dez passes desde a defesa sem ser importunado. Leo Valencia recuou, rolou para Lindoso na direita. A ultrapassagem de Marcinho sobre Paquetá foi impecável e o cruzamento no capricho. Luiz Fernando se antecipou fácil a Rhodolfo e, no golpe de vista de Diego Alves, a bola morreu no fundo da rede rubro-negra. 1 a 0. Na comemoração, mão no nariz e ironias ao cheirinho. Sem celeumas, desta vez.

Fla ao fim: atacantes empilhados, time bagunçado e Diego de faz-tudo

O segundo tempo trouxe um Flamengo ainda mais afoito. Embora fosse necessário apenas um empate para avançar à final, o time e o técnico sabiam que o jogo não se desenvolvia. As duas trocas, Cuellar na vaga de Jonas e Geuvânio na de Arão, praticamente foram uma admissão de culpa de Carpegiani. O time se estabeleceu no 4-1-4-1, com Vinicius Junior à esquerda, Diego e Paquetá por dentro, Geuvânio à direita. O Botafogo manteve a postura mais defensiva. Fechou-se com cinco homens à frente da defesa e manteve Brenner no ataque. Buscava saídas rápidas para tentar ampliar a vantagem. E sabia que sofreria. Ao menos de longe. Seriam 45 cruzamentos rubro-negros até o fim da partida. Sem alternativas de penetrar na defesa, o Flamengo girou ao redor dela e tentou apenas alçar a bola.

Diego foi o símbolo. Tornou-se uma espécie de faz-tudo, voltando para iniciar o jogo e correndo de ponta a ponta no meio para lançar bolas ou cruzá-las na área. Um esforço quase em vão. O Botafogo não dava espaços para dribles. Geuvânio e Vinicius Junior, habilidoso, até passavam de um, mas já encontravam a sobra que afastava a bola sem maior problemas. Frio, o Botafogo transferia o nervosismo ao Flamengo, irritadiço. Inquieto, Carpegiani trocou Paquetá por Marlos Moreno com 17 minutos a segunda etapa. Mais uma entre inúmeras contradições, iniciadas com a escalação e que continuavam com Geuvânio, autor de dois gols contra a Portuguesa e fora até do banco diante do Fluminense. Até então, em três jogos no Carioca, Moreno, em meio a lesões e cortes de relação, jogara apenas 92 minutos.

No desespero, o Flamengo mergulhou no caos. Cuellar à frente da defesa, laterais avançados, Diego pelo centro tentando alçar bolas e o time por vezes em um desorganizado 4-2-4, empilhando atacantes na tentativa do gol salvador. Henrique Dourado, bem perseguido por Carli e Igor Rabello, conseguiu uma jogada em cruzamento de Everton. Cabeceou na trave direita de Jefferson. Irritadiço, o Flamengo errava e passava o tempo. Vinicius Junior, decisivo na semifinal da Taça Guanabara, era o símbolo. Furou chute fácil em bola sobrada de frente para Jefferson e errou um drible ao parar com a bola na linha de fundo. Xingava, colocava as mãos na cabeça. Um processo de amadurecimento do garoto de 17 anos.

Ao fim, um Botafogo mais fechado para segurar a classificação

Alberto Valentim manteve sua equipe à la Jair Ventura ao fim. Fez trocas, com as entradas de Pimpão e Marcelo Benevenuto nas vagas de Leo Valencia e Renatinho. Segurou as subidas dos laterais. Trancou-se num 4-5-1 e trabalhou com o cronômetro e o desespero alheio. Apenas mais uma cabeçada de Marlos Moreno em cruzamento de Pará assustou, mas Jefferson fez boa defesa no meio do gol. Competente, o Botafogo chegou à final de forma até surpreendente. Enxergou a tempo o reflexo no espelho para assimilar a forma que tem. Não é belíssima. Mas foi o suficiente. Equilibrada.

O contrário do Flamengo. Com 57% de posse de bola e 45 cruzamentos, o time rubro-negro mostrou-se pobre e perdido. Nem de longe lembrou a equipe que venceu bem o Emelec na Libertadores, melhor partida do ano. Mas uma exceção. Entre jogos apáticos, o time teve um dos jogos mais caóticos dos últimos meses. Não competiu, nem ameaçou. E foi incapaz até de trabalhar com a vantagem do empate. Serão dez longos dias até a estreia no Brasileiro e o repensar da República do Ninho do Urubu, que deverá ser refundada para que novas ideias refresquem a oxidação de velhas panelas. De forma tão precoce, o Flamengo já tem um vexame para colecionar em 2018. Não é menosprezo ao Botafogo. Com investimentos e qualidades técnicas tão distintos, o feito do Glorioso foi enorme. Em menos de dois meses, inverteu a lógica da Taça Guanabara. Achou equilíbrio para ir à final. E mergulhou o maior rival no mais completo caos.

FICHA TÉCNICA
FLAMENGO 0X1 BOTAFOGO

Local: Maracanã
Data: 28 de março de 2017
Horário: 21h45
Árbitro: Marcelo de Lima Henrique (RJ)
Público e renda: 28.215 pagantes / 31.888 presentes / R$ 808.555,00
Cartões Amarelos: Jonas e Cuellar (FLA) e Jefferson, Igor Rabello e Brenner (BOT)
Gol: Luiz Fernando (BOT), aos 38 minutos do primeiro tempo

FLAMENGO: Diego Alves; Pará, Rever, Rhodolfo e Everton; Jonas (Cuellar / Intervalo) e Willian Arão (Geuvânio / Intervalo); Vinicius Junior, Diego e Lucas Paquetá (Marlos Moreno, 17’/2T); Henrique Dourado
Técnico: Paulo César Carpegiani

BOTAFOGO: Jefferson; Marcinho, Carli, Igor Rabello e Moisés; Marcelo e Rodrigo Lindoso; Luiz Fernando, Renatinho (Marcelo Benevenuto, 36’/2T) e Leo Valencia (Rodrigo Pimpão, 30’/2T); Brenner (Pachu, 39’/2T)
Técnico: Alberto Valentim

Os comentários estão encerrados.