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Histeria histórica faz um dócil Flamengo sucumbir ao Cruzeiro na Libertadores

Everton Ribeiro Flamengo 2018 Libertadores

(Gilvan de Souza / Flamengo)

Mauricio Barbieri Flamengo 2018

(Gilvan de Souza / Flamengo)

Uma das tarefas mais árduas do Flamengo ao disputar um jogo decisivo de Libertadores é controlar os nervos. Há uma predisposição no universo rubro-negro ao clima de histeria coletiva ao menor sinal negativo. Não há margem de erro diante de um histórico tão sofrível na maior competição continental. É dever, portanto, trabalhar para um maior controle mental. Isto porque o Flamengo atual, como visto diante do Grêmio na Copa do Brasil, tem uma ideia de jogo bem amadurecida. Troca vasta de passes, imposição ao adversário. Falta, portanto, mentalidade equilibrada para mantê-la, como observado na derrota diante dos reservas do próprio Grêmio dias depois. Há dificuldades na euforia e na depressão. Sem tal preparo, o Flamengo, uma vez mais, foi dócil ao adversário na Libertadores. Trocou as pernas, mostrou nervosismo e sucumbiu diante do Cruzeiro no Maracanã, nas oitavas de final de uma Libertadores que já parece próxima do adeus.

Fla no início: confuso, espaçado, nervoso e em busca de alçar bolas

A necessidade de se atentar aos mínimos detalhes não é tarefa apenas de quem trabalha com campo e bola no Ninho do Urubu. Nos corredores da Gávea é necessário trabalhar para minimizar qualquer impacto negativo em um clube traumatizado em competições sul-americanas. Tentar blindar efeitos que cheguem ao campo. Medir com precisão a precificação dos ingressos é uma delas. No embalo que o levou à liderança do Brasileiro antes da paralisação para a Copa do Mundo, o Flamengo jogou em um Maracanã constantemente lotado e pulsante, com preços mais acessíveis. A identificação com a ponte criada por Vinicius Junior e companhia refletiu em uma sinergia especial. Mas desmontada com preços mais altos diante do Cruzeiro, resultando em uma arquibancada mais fria e com um setor, no caso o Sul, bem vazio. Impacta. Como o respeito pelo clube em competições sul-americanas em seus domínios. É muito reduzido. Nestor Pitana, árbitro de final de Copa do Mundo, transforma-se sem objeções num conivente apitador que admite a cera do adversário e permite o jogo ao gosto rival, embora sem impacto direto no resultado. Mas enerva. É parte do jogo. É parte do bastidor. Em 2017, o Flamengo decidiu não enviar representante ao sorteio da Copa Sul-Americana. Parece não entender o jogo que quer tanto jogar.

É um pacote no universo rubro-negro que conduz o ritmo à euforia ou, no caso da Libertadores, à histeria. E há, neste pacote, o principal. O campo. O jogo. O Flamengo mostrou ainda estar despreparado para a Libertadores. Não apenas por parecer ignorar que faltariam pernas ao time em sequência tão insana neste agosto decisivo. Mas, também, por ter sido ingênuo ou irresponsável em maio, quando decidiu mandar Lucas Paquetá, pendurado, a campo diante do River Plate mesmo com a equipe já classificada. O resultado foi uma suspensão do jogo de ida das oitavas. Impacta. Pois Mauricio Barbieri sem seu principal jogador, ainda que displicente neste pós-Copa, viveu noite ruim em suas escolhas. Tanto na escalação quanto em substituições. Tentou mandar a campo o Flamengo no 4-1-4-1 mesmo sem um jogador com as características de Paquetá. Jean Lucas, o substituto, já havia cumprido jornada ruim diante dos reservas do Grêmio na vaga de Diego. Justamente por ser diferente. Carrega a bola, corre com ela em vez de fazê-la correr sozinha, com passes variados. E, garoto com apenas 809 minutos jogador em 2018 até então – quase metade em meros cinco jogos no Carioca – sentiu o tamanho do confronto no Maracanã.

Cruzeiro no início: postura ofensiva, aproveitando espaços

Do outro lado, Mano Menezes apresentava seu cardápio como uma raposa, sem trocadilho. Indicava um 4-2-3-1, mas que se transformava rapidamente em 4-4-2, deixando Thiago Neves e Barcos à frente, com os recuos de Arrascaeta e Robinho pelos lados. O Cruzeiro era uma onda azul. Avançava e recuava em ritmo parecido, tentando deixar o Flamengo indeciso quanto ao posicionamento. Fechava muito bem o meio e dava botes precisos em Diego, sem deixá-lo pensar. Obrigava o camisa 10, então, a reter a bola, girar. A irritar a arquibancada. À esquerda, Lucas Silva acompanhava bem Jean Lucas e sufocava Everton Ribeiro ao lado de Egídio, empurrando o camisa 7 para o lado, tentando impedir que ganhasse o meio, o forte rubro-negro. O jogo do Flamengo em minutos minguou. Sem troca de passes, com Cuellar também pressionado na saída de bola, não foi raro ver o time tentar lançamentos.

Em um deles, a bola voltou aos pés cruzeirenses. Thiago Neves lançou Robinho na direita, que teve espaço, girou e achou Arrascaeta solitário, mas em condição dada por Rodinei, para marcar com frieza diante de Diego Alves. 1 a 0. O relógio contava apenas nove minutos. Era um indício negativo. E o clima de histeria se instalou precocemente no Maracanã, algo peculiar ao Flamengo em Libertadores. Talvez fosse em outra competição e longe de seus domínios, o Flamengo optaria por fazer sua ideia de jogo prevalecer, como diante do Grêmio na Copa do Brasil. Sem desespero, troca vasta de passes, aproximação. Foi o contrário. A cada passe errado, principalmente de Rodinei ou Jean Lucas, a arquibancada resmungava. Irritada, xingamentos eram ouvidos. Alguns batiam palma. O universo rubro-negro, atordoado, parecia sentir que uma vez mais iria sucumbir à maldição sul-americana.

O time, então, se lançou à frente de forma desorganizada. Diego abriu demais pela esquerda, tentando espaço para alçar bolas à área. Marlos caía para dentro, procurando as costas de Henrique e a área. Everton Ribeiro e Jean Lucas embolavam à direita com Rodinei, sempre opção. O Cruzeiro sorria. O meio, já de seu domínio, tinha agora apenas um sobrecarregado Cuellar pela frente. Muito bem organizado, com jogadores experientes, o time mineiro fez da calma a sua arma. Saía com inteligência pelo centro, buscava os lados, tentando a inversão de bola para explorar as subidas de Rodinei ou Renê. Arrascaeta tinha mais espaço em seu setor. Por ali, Everton Ribeiro foi desarmado por Lucas Silva e o uruguaio foi lançado. A quebrada ao meio enxergou Robinho na direita, às costas de Rever e Renê e na cara de um desesperado Diego Alves. O passe saiu no limite. Thiago Neves, de frente para o gol, cabeceou na trave. O baile era azul.

Fla ao fim: tentativa de abafa, mas já sem pernas, cedendo espaços na defesa

Aos resmungos, o Flamengo achou algumas alternativas ao forçar o jogo pela direita e conseguir escanteios. Diego, por duas vezes, quase chegou a completá-los na segunda trave. Rodinei, por duas vezes, bateu fácil em cima de Fábio ao receber de Everton Ribeiro, em rara oportunidade na qual o camisa 7 conseguiu quebrar para o meio e achar algum espaço. O Flamengo desceu o vestiário sob vaias, rumo a um divã. Era incrível como o time racional que apresentou futebol tão bem jogado e competitivo diante do campeão da América, uma semana antes, falhava, nervoso e no alçar de bolas, em casa. Seria necessária, talvez, uma mudança. Trazer Everton Ribeiro ao jogo, abrir a defesa cruzeirense. No segundo tempo, ela não chegou.

Barbieri preferiu manter a mesma equipe com uma leve alteração de posicionamento: Jean Lucas esticado na direita, Everton Ribeiro por dentro. Um diálogo maior entre seus meias. Até houve maior troca de passes. Mas pouco efetiva. Rapidamente, Everton caiu à extrema direita, enquanto Jean Lucas voltou para ocupar o espaço por dentro. O Flamengo, dócil, aceitava a oferta cruzeirense de avançar, não ser perigoso e dar espaços às suas costas.

A equipe mineira estrategicamente recuara. Nada de pressão na saída de bola. Mano queria o contra-ataque, o que deixou claro com a troca do esforçado Barcos pelo veloz Raniel. Barbieri devolveu com Vitinho na vaga de Jean Lucas. Esticou Vitinho à esquerda, Marlos à direita, Everton Ribeiro por dentro e Diego mais recuado, tentando iniciar o jogo. Não deu certo. O Cruzeiro se animou com a pouca efetividade do meio e voltou a dar botes com facilidade nos meias rubro-negros. Everton Ribeiro perdeu bola para Raniel, que bateu forte, perto da trave de Diego Alves. Em avanço de Edilson pelo meio, Cuellar deu pique de claro esforço e, sem outra arma, o derrubou próximo à área, levando amarelo. A arquibancada chiava, reclamava. Faltavam, na verdade, pernas. O raciocínio diminuía diante do cansaço. Os erros aumentavam. O fôlego sumira diante de um time com sequência tão cruel. Impacta. E Mano percebeu.

Ao fim, Cruzeiro muito confortável com vantagem atrai o Flamengo

Refrescou, então, os pulmões cruzeirenses. Robinho, amarelado, deu lugar a Rafinha. O Flamengo avançava, entregava campo às suas costas. E não conseguia acompanhar um contra-ataque veloz se desarmado. Raniel roubou a bola de Renê e avançou, fazendo o jogo girar a Rafinha e Lucas Silva. Cuellar e Diego, abatidos, tentavam algum tipo de combate. Raniel recebeu de novo pelo meio e tocou para Rafinha na direita. Ele ajeitou a pelota e bateu rasteiro ao meio. Entregue, o Flamengo apenas assistiu a ajeitada de Arrascaeta para Lucas Silva, livre, bater forte de fora da área e ver Thiago Neves desviar para o gol. 2 a 0. Imponente para os azuis. Vexaminoso para os rubro-negros.

As vaias deram o tom da arquibancada de um Flamengo que, já com Lincoln no lugar de Marlos, girava o jogo na intermediária e alçava bolas à área, talvez apostando em uma bola salvadora pelo alto com Uribe, novamente uma negação pelo chão. Não veio. Com o Cruzeiro bem fechado com cinco jogadores atrás de Raniel, o jogo estava selado. Partida que teve, de acordo com o Footstats, 62% de posse de bola rubro-negra, com cinco finalizações no alvo, msmo número do Cruzeiro. Foram 36 cruzamentos na área celeste. E apenas nove desarmes contra 19 do rival. Cuellar, sempre destaque no quesito, contou apenas um. Faltaram pernas. Faltou calma. Faltou raciocínio. Faltou planejamento. Cabe ao clube decidir a cara que deseja dar a esta temporada. Bater o martelo sobre prioridades. Uma vez mais, o Flamengo e sua conhecida histeria parecem ter sucumbido na Libertadores. Uma das três frentes parece já ter virado pó.

FICHA TÉCNICA
FLAMENGO 0X2 CRUZEIRO

Local: Maracanã
Data: 8 de agosto de 2018
Árbitro: Nestor Pitana (ARG)
Público e renda: Pagante: 41.533 pagantes / 45.967 presentes / R$ 3.273.740,00
Cartões amarelos: Cuellar (FLA) e Thiago Neves e Robinho (CRU)
Gols: Arrascaeta (CRU), aos nove minutos do primeiro tempo e Thiago Neves (CRU), aos 32 minutos do segundo tempo

FLAMENGO: Diego Alves; Rodinei (Pará, 40’/2T), Léo Duarte, Rever e Renê; Cuellar; Marlos Moreno (Lincoln, 31’/2T) , Everton Ribeiro, Jean Lucas (Vitinho, 18’/2T) Diego e Vitinho; Uribe
Técnico: Mauricio Barbieri

CRUZEIRO: Fábio, Edilson, Dedé, Leo e Egídio; Henrique e Lucas Silva; Robinho (Rafinha, 27’/2T), Thiago Neves (Ariel Cabral, 35’/2T) e Arrascaeta; Barcos (Raniel, 16’/2T)
Técnico: Mano Menezes