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O ódio, a fofoca e o jornalismo: a confusão de Eduardo Baptista

Eduardo Baptista Palmeiras

Eduardo Baptista PalmeirasReta final do Campeonato Brasileiro de 2009. Ninho do Urubu. O chefe do departamento médico do clube, José Luiz Runco, informa que Adriano, principal jogador da equipe que buscava o título, está fora da penúltima rodada do Campeonato Brasileiro, contra o Corinthians. O motivo: uma queimadura no calcanhar esquerdo. Adriano argumentou que sofrera o ferimento ao pisar em uma lâmpada no jardim de casa. O repórter Janir Júnior, no jornal O Dia, revelou a causa sem revelar suas fontes. Adriano queimara o pé em um cano de descarga de moto, num passeio na Vila Cruzeiro. Foi desfalque quando os rubro-negros mais contavam com ele. Notícia. Para Eduardo Baptista provavelmente seria uma fofoca.

O acesso de raiva do técnico do Palmeiras na coletiva após a vitória sobre o Peñarol, no Uruguai, indicou um profissional pressionado. Somados os nervos à flor da pele diante dos momentos de pânico para escapar da tocaia formada por uruguaios, Eduardo passou do tom. Explodiu com socos na mesa, palavrões, dedo em riste e elegeu um culpado. A imprensa. Mas mirou em um lado e acertou em outro. Tentou acender um debate sobre a qualidade do jornalismo esportivo no país e confundiu alhos com bugalhos. Recorreu às fake news que tiveram protagonismo durante a eleição de Donald Trump à presidência dos EUA. Pediu que a fonte do motivo de sua ira fosse revelada. Nada disso tinha relação com o momento. Chegou a ser ingênuo para um profissional há tanto tempo no futebol.

O ódio de Eduardo foi direcionado a uma nota do jornalista Juca Kfouri em seu blog no UOL. Roger Guedes teria brigado com o técnico e, depois, sido escalado com interferência externa. Não existe fofoca aí. É informação, apurada por um jornalista com décadas de credibilidade nas costas. Não existem fake news, a ideia de fabricar notícias para favorecer um lado e interferir em um panorama. Há checagem de fatos. Com fontes que têm seu sigilo assegurado pela Constituição. Eduardo, transtornado, socou a mesa e quis pautar o que vale ou não ser abordado pelo jornalismo esportivo. “Se não for sobre futebol, vai queimar a pergunta”, avisou a um repórter após berrar pela identificação da fonte. Houve quem comemorasse o destempero e visse ali a brecha para levantar um debate racional. No mínimo contraditório. Um tiro no vazio.

Não há dúvida de que o futebol deve ter um debate mais aprofundado, com análises e menos imediatismo e sensacionalismo. É uma parte do todo que compõe a profissão. Mas há um ingrediente fundamental neste pacote: o jornalismo. A raiz da profissão é identificar o que é notícia e informar quem a consome. Para isso é preciso gastar sola de sapato, conversar com fontes, colecionar alguns anos de estrada acompanhado, in loco, treinamentos, entrevistas coletivas, jogos. O extracampo influencia no campo. E vice-versa. Assim é possível ter o discernimento necessário para executar a profissão. Não apenas observar tudo de longe. Entender o jogo. Saber que está longe de ser desqualificada como fofoca a informação de uma briga entre Roger Guedes e seu treinador. Compreender que Adriano ter queimado o pé de forma irresponsável em uma moto e desfalcar o time na reta final não é disse-me-disse. É notícia. É jornalismo.

Eduardo Baptista provavelmente ganhou alguns simpatizantes com a transformação que nem mesmo Dunga foi capaz de ter. “Mitou” em redes sociais que pedem imprensa séria, mas se refestelam com postagens provocativas como crianças de 12 anos em perfis oficiais de clubes gigantescos. E formam grupos para atacar autores de notícias que não os agradam. Vivem em uma bolha. Talvez o técnico tenha mostrado ainda ser cedo para comandar um time com a tradição e o elenco pesado como tem atualmente o Palmeiras. Pressões serão constantes. Vazamentos, também. É o ambiente do futebol. No Brasil, na Inglaterra ou na Espanha. Mas convém segurar a raiva e contra-atacar de outra maneira. O ódio cega. E confunde. Eduardo tem razão ao pedir mais análise sobre futebol, menos debates clichês e piadinhas, um outro debate. Mas não teve nenhuma ao querer abordar um universo desconhecido sem propriedade. Deixou-se confundir. E não foi capaz de enxergar que notícia não é fofoca.

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