Em um olhar, a fábula rubro-negra: Flamengo, bicampeão da Libertadores
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Patamar de um time único: Flamengo baila na Arena e reafirma choque no futebol nacional

Flamengo gol comemoração Palmeiras Brasileiro 2019 Allianz Parque

(Flamengo / Divulgação)

Gabigol gol Palmeiras Brasileiro 2019 segundo turno Palmeiras Allianz Parque

(Flamengo / Divulgação)

A estapafúrdia e descabida recomendação do Ministério Público de São Paulo, engolida de forma cordata por quem deveria combatê-la, até tentou de forma mimada diminuir o sorriso da torcida do Flamengo ao determinar torcida única na tarde deste domingo, em São Paulo. Mas parece ser impossível em 2019. Bruno Henrique avisou, até mesmo provocou e virou protagonista de memes. Mas, convenhamos, é verdade: o Flamengo está em outro patamar no futebol brasileiro. Sobra na turma com uma facilidade pouco vista nas últimas duas décadas nos campos daqui. Sem ter quem torcer por si na arquibancada do estádio Allianz Parque, os rubro-negros berraram dentro de campo ao escancarar a diferença. Um 3 a 1 sem atropelo, em ritmo de treino e que só não configurou uma goleada superior porque, afinal, há um Mundial a disputar pela frente. Desnecessário forçar. Quando quis, o Flamengo demonstrou que não há competitividade entre as agremiações, ao menos no momento. O recado foi dado com o baile apresentado principalmente no primeiro tempo. O jogo entre primeiro e terceiro colocados no Allianz Parque foi, na realidade, de um time único.

Rival do Fla no início: espaçado, desorganizado e engolido

Poderia o Flamengo esvaziar o dito espetáculo com um time reserva, um jogo sonolento. Que nada. A filosofia de vida futebolística de Jorge Jesus não permite. Quando chegou ao clube e propagou que desejava vencer, vencer, vencer “como no hino” pareciam palavras jogadas ao vento. Coleciona agora incríveis 28 partidas de invencibilidade, quatro meses sem perder uma única partida. Assombra pelos números, mas pela maneira que se posta em campo. Entrou no Allianz no já clássico 4-4-2. Sem Marí, mas com Rhodolfo. Sem Everton Ribeiro, mas com Vitinho. A ideia permanece. Uma equipe avançada, pressionando a saída do adversário e com uma troca de posições no setor ofensivo que torna infernal criar dificuldades. Só mesmo o até então campeão da América, River Plate, conseguiu de fato emperrar este Flamengo quando em um jogo que estava por completo, de corpo e alma. Neste domingo, nem isso. O Flamengo tinha intensidade abaixo do comum e acelerava vez e outra como se quisesse brincar com o rival. Vamos lá, agora vale. E o adversário, sem opções táticas para responder, sucumbia de forma constrangedora.

No início, Fla ofensivo como sempre, em bloco e com muita movimentação

Tentou o rival rubro-negro, postado inicialmente em um 4-2-3-1, adiantar a marcação como fizera o River uma semana antes. Mas há, claro, a necessidade de fazê-lo de forma organizada. O adversário ainda não o é, nem mesmo com um técnico por vezes elogiado justamente por ter ao menos consistência defensiva. Se não está devidamente treinado para marcar de forma avançada, deixa de ser agrupado e forma latifúndios onde o Flamengo, habilmente, aproveitou. Muito se alertou Jorge Jesus sobre sua defesa adiantada. De fato, sofreu nos primeiros jogos. Com ajustes, zagueiros rápidos e de boa saída de bola, funciona bem. Não foi o caso do rival. Adiantou-se e, totalmente quebrado, não marcou o básico da movimentação rubro-negra: Bruno Henrique sai do lado esquerdo do ataque para ocupar o centro entre volantes e zagueiros. Ao observar a movimentação do Camisa 27, Arrascaeta e Gabigol rapidamente atacam a área. E foi assim. Enfiada de bola, o artilheiro livre à frente do goleiro e o passe macio para Arrascaeta fazer seu 16º gol na temporada, ainda que depois de uma demora inexplicável do possante VAR para conferência de um impedimento claramente inexistente.

Apático, o rival rubro-negro se concentrava nas ações de seu principal jogador. Cabia a ele o fardo de criar opções ofensivas e ainda finalizar. Cabeceou bola bem defendida por Diego Alves e depois cruzou na medida para o companheiro que não conseguiu pegar o ritmo da bola e mandou para fora. Sofreu pênalti não marcado de Rhodolfo, que destoava no Flamengo ao optar por limpadas, ao contrário da saída de jogo utilizada por Pablo Marí com competência. Era pouco. Uma massa desorganizada de camisas verdes trocando espaços de forma completamente dessincronizada. Dependia apenas do ritmo do Flamengo. Caso o rubro-negros decidem acelerar, perigo. Rafinha avançava com facilidade e dialogava com Vitinho. O lateral rival mal conseguia acompanhar. O melhor jogador adversário sofria para tentar o combate no lateral e impedir o ataque em bloco do Flamengo. Era duro. Vitinho puxava para dentro e tinha inúmeras opções de passe. Arrascaeta recebia, limpava da esquerda ao centro e acionava rapidamente Bruno Henrique ou Gabigol nas esticadas às costas da defesa. Sincronizado.

Rival do Fla ao fim: mais adiantado, buscando gol de honra

Por ali, o Flamengo teve ótimas chances. Vitinho cabeceou em cruzamento de Rafinha para defesa espetacular do goleiro. Depois, Vitinho recebeu de Bruno Henrique e avançou com a defesa adiantada do rival. Cruzou na medida para Gabigol, que bateu rápido, mas o goleiro fez outra ótima defesa. O adversário estava inerte. Tentou adiantar um dos volantes para ter mais presença ofensiva. O outro, reforço que pouco jogou, não se achava em campo, nem mesmo mais à direita. O meia contratado a peso de ouro era desarmado como uma criança. Níveis diferentes. Ficava bem claro a cada jogo acelerado do Flamengo. No fim do primeiro tempo, o golpe fatal. Vitinho de novo com facilidade avançou e tentou o drible. Na sobra, Rafiha também chegava com facilidade. Ocupou o meio e cruzou na medida para Arrascaeta. O passe, soberbo, é de quem é genial ao ler o jogo, mas também de quem conhece plenamente a movimentação do companheiro. Não é ao acaso. É treinado. Gabigol dá dois passes para trás e arranca. Recebe e bate cruzado em meio a zagueiro e lateral. 2 a 0 diante de um mandante completamente dominado e assustado.

Fla ao fim: intensidade mais baixa, menos velocidade

Na segunda etapa, o técnico adversário tentou dar intensidade a um time desmanchado. Necessita, porém, estar treinado. Ao tentar emular o Flamengo com uma saída de bola limpa, de pé em pé, o susto. Jorge Jesus sacou Bruno Henrique, dores na coxa direita, abriu Vitinho na esquerda, deixou Diego por dentro e Gerson à direita. Foi justamente o Camisa 8 o responsável pelo bote no zagueiro rival. Na sobra, Gabigol não deu perdão. Chute forte, com leve desvio. 3 a 0. Um baile para determinar que o heptcampeão brasileiro que largara sob a Era Jorge Jesus oito pontos atrás estava agora 19 à frente. 27 pontos – ou nove rodadas – arrancados na base de um trabalho evidentemente muito superior. Jorge Jesus retirou velocidade da equipe ao sacar também Vitinho para a entrada de Piris da Motta. Ironia fina com o desejo do MP-SP, a única torcida no local passou a pressionar o próprio mandante. Foram duas bolas na trave, um gol com a contribuição de Rodinei e Rhodolfo e o placar reduzido a 3 a 1. Mas o baile estava sacramentado, como no primeiro turno, no Maracanã. 53%* de posse e três gols em oito finalizações no alvo num jogo que acelerou quando quis. Organizado, bem treinado. Heptacampeão, o Flamengo jogou por si e pela própria torcida, vetada da festa num ambiente que deveria primar pela democracia e a convivência de lados opostos. Os jogadores rubro-negros aplaudiram, antes e após o jogo, o espaço vazio destinado aos visitantes. Na bola e na percepção do que é necessário para o bom funcionamento do futebol. O Flamengo está, mesmo, em outro patamar.

*Números do App Footstats Premium

FICHA TÉCNICA
1X3 FLAMENGO
Local: Allianz Parque
Data: 01 de dezembro de 2019
Árbitro: Ricardo Marques Ribeiro (MG – Fifa)
Público e renda: 22.219 presentes / R$ 1.291.119,45
Cartões amarelos: Rafinha, Vitinho (FLA)
Gols: Arrascaeta (FLA), aos quatro minutos e Gabigol (FLA), aos 45 minutos do primeiro tempo; Gabigol (FLA), aos quarenta segundos e aos 38 minutos do segundo tempo

Técnico:

FLAMENGO: Diego Alves, Rafinha (Rodinei, 13’/2T), Rodrigo Caio, Rhodolfo e Filipe Luís; Willian Arão, Gerson, Vitinho (Piris da Motta, 24’/2T), Bruno Henrique (Diego / Intervalo),
Técnico: Jorge Jesus

*O Chute Cruzado optou por não mencionar o adversário do Flamengo ou seus jogadores nesta análise. Se autoridades consideram justa a ausência por motivo injustificado de torcida visitante, com a conivência silenciosa de quem deveria combatê-la, a análise do jogo pode, também, ficar incompleta. Assim como a arquibancada do Allianz Parque, incapaz de compreender que o bom convívio entre lados diferentes é primordial não só ao futebol como à sociedade. Como diria Arnaldo Ribeiro, arquibancada forma caráter. E, neste domingo, ela falhou miseravelmente neste sentido.  

  • Rojedo

    Descobri o site há pouco tempo. Parabéns pelos textos e análises dos jogos. Vida longa ao Chute Cruzado! 👏🏼 👏🏼