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A arte de frustrar: Flamengo volta à amarga rotina da Libertadores

Flamengo Gabigol 2019 Peñarol Libertadores Maracanã

(Alexandre Vidal / Flamengo)

Há um termo cunhado pela própria torcida do Flamengo para explicar a facilidade do time em frustrar diante de condições favoráveis. Boa fase, estádio abarrotado, possibilidade de alguma marca histórica. A Flamengada. Constitui a Flamengada um misto de despreparo mental e também de organização da equipe, geralmente incapaz de reagir diante de situações adversas. Na Libertadores, a característica aflora. O gol de Viatri já no fim da partida, decretando a vitória de 1 a 0 do Peñarol no Maracanã, foi apenas mais um capítulo de um carrossel de frustrações. Na competição sul-americana, especialmente, o Flamengo detém a arte de frustrar.

Fla no início: Arão avançado, pouco espaço e saída de bola prejudicada

De volta ao comando do time à beira do gramado, Abel conseguiu emplacar uma sequência de boas vitórias com uma maneira de atuar. Mesmo após início claudicante, alternando escalações, este Flamengo de 2019 se caracterizou pela incrível pressão na saída rival, a rápida retomada de bola e a saída em velocidade com Gabigol e, principalmente, Bruno Henrique. Para isso, precisa de espaço. Sem ele, deve ter alternativas. Mostrou, ao menos por enquanto, ainda não as ter. Diante do bafejar de mais de 60 mil torcedores na arquibancada ansiosos pela vitória, a desorganização ajudou a sufocar o time. A derrota mental foi inevitável.

No início, Peñarol bem fechado, preocupado em não ceder espaços

A postura do adversário, óbvio, influencia diretamente na ansiedade rubro-negra. Pois o Flamengo rende melhor no 4-2-3-1 quando Willian Arão está em campo. Postado como volante, atacando como elemento-surpresa e fechando o lado direito quando Pará dispara para dar opção a Everton Ribeiro, o camisa 5 contribui. Ao encontrar um Peñarol muito bem fechado em um 4-1-4-1, reduzindo qualquer indício de espaço para o jogo veloz dos donos da casa, o time inexplicavelmente se desestruturou. Arão disparou à frente, alinhando-se a Diego e aos dois pontas, postado mais como meia, entricheirado entre os uruguaios. Claramente preparado para enfrentar o adversário, o Peñarol foi eficaz: fechou os espaços para Rodrigo Caio, geralmente o desafogo em um passe agudo para iniciar o ataque rubro-negro. O camisa 3, por inúmeras vezes, teve de segurar a bola e tocar ao lado. Cuellar, outra opção de jogo, também era bem acompanhado, ora por Cebolla Rodríguez, ora por Nuñez. O Peñarol não tinha pressa. Saba que virar o jogo mental a seu favor seria fundamental.

Ainda que mostrasse enormes dificuldades em atuar diante de um rival bem fechado, o Flamengo conseguiu, no início da partida, uma bela oportunidade. Diego achou justamente um passe agudo, em velocidade, para Gabigol. A chance de desestruturar o jogo rival estava ali. Bola à feição, esperando o arremate cruzado, para pôr o Flamengo à frente, dissipar a tensão na atmosfera e provocar incômodo no Peñarol. A batida cruzada para fora do camisa 9 frustrou. O jogo apresentava dificuldades além do já encontrado na temporada. Bruno Henrique, sem espaço, era nulo. Everton Ribeiro driblava um, dois, mas não tinha opções de passe com o bom sistema defensivo uruguaio. Trocava com Gabigol, ia o meio com o atacante caindo à direita. Em vão. O Flamengo não agredia. Não achava espaços. Sofria.

Em determinado momento da primeira etapa, o Peñarol conseguiu se aproximar da posse de bola rubro-negra. Em seguida, recuou. Entendeu ser melhor esperar e continuar a marcar com eficiência a partir da intermediária. O rival simplesmente não apresentava alternativas necessárias para mudar o panorama do jogo. Arão avançado, Diego recuado para tentar iniciar o jogo em vez de Rodrigo Caio ou Cuellar. Seria questão de tempo para encaixar uma bola. Ela quase chegou no rápido contra-ataque de Brian Rodríguez, que passou com facilidade por Cuellar e cruzou na pequena área, onde Canobbio bateu até com desleixo, mas suficiente para Diego Alves ter enorme trabalho. Graças ao seu goleiro, o Flamengo não desceu ao vestiário já com a derrota nas mãos.

Seria natural esperar que Abel colocasse Arrascaeta em campo. Não apenas devido ao alto investimento, feito especialmente para resolver problemas na Libertadores. Não apenas por ter sido decisivo no clássico contra o Vasco. Mas por trazer consigo a característica de achar espaços. Enxergar o que ninguém vê. Diante de um adversário fechado, uma carta ideal. Inexplicavelmente, nenhuma mudança no segundo tempo. O time até tentou pressionar mais a saída do Peñarol, repetindo a fórmula que teve muito sucesso contra a LDU. Mas os uruguaios, bem organizados, logo arrefeceram o furor rubro-negro ao adiantar um pouco a equipe, empurrando o Flamengo para longe da sua área. A partir daí, o rubro-negro perdeu na parte mental.

Fla ao fim: espaçado, nervoso e com bolas alçadas

A corrida contra o cronômetro apresentou um Flamengo ansioso. Seria exagero dizer irritadiço, mas Diego, por exemplo, arriscou sua permanência em campo com um carrinho exagerado em Brian González. Levou amarelo e, fisicamente, parecia já cansado após tentar buscar tanto o jogo no primeiro tempo. A não entrada de Arrascaeta, portanto, era mais inexplicável. Abel tentou apresentar novidades. Sacou Arão e pôs Vitinho, uma boa opção de drible e finalização a longa distância diante da uma equipe tão fechada. Talvez uma tentativa de abrir dois pontas, com Bruno Henrique indo à direita para esgarçar a marcação do Peñarol e, assim, surgir espaços? Ainda assim, faltaria Arrascaeta para achá-los. Mas o que se viu foi Gabigol rumo ao lado direito, com Bruno Henrique centralizado. Uma tentativa de atacar….pelo alto. Gabigol puxava a pelota ao centro e alçava a bola na tentativa do camisa 27, ótimo jogo aéreo, achar uma bola salvadora. Pouco. Foram 26 cruzamentos na partida. Nenhum com sucesso.

Ao fim, Peñarol mais avançado, trocando passes

Diante de um Flamengo ansioso, adiantado, alçando bolas em busca de uma salvação, o Peñarol passou a retomar a posse e sair com boa troca de passes. Diego López pôs Rojo para forçar o lado direito rubro-negro, com Gabigol bem adiantado. Deu certo. Afoito demais, o camisa 9 deu carrinho desclassificante em Rojo e acabou expulso. Neste instante, o Flamengo deu um bico definitivo na razão. Passou a querer responder os anseios da torcida com o coração, lançando-se ao ataque de forma desorganizada. Era óbvio que flertar com o empate seria mais benéfico a longo prazo na Libertadores. A derrota seria catastrófica. Assim nasce a Flamengada.

Em um estádio abarrotado e com possibilidade de melhor início de campanha na história do clube na Libertadores, o Flamengo encolheu. Ao mínimo indício de dificuldade de fazer o seu jogo, não buscou alternativas simplesmente por não as ter. Ansioso, deu campo ao Peñarol ao atuar de forma totalmente espaçada. O time uruguaio desejava um contra-ataque, em boas condições. Teve aos 42 minutos do segundo tempo, quando retomou a bola e avançou sem incômodo com Lucas Hernández, até o cruzamento caprichado na cabeça de Viatri. O gol sacramentou não apenas a derrota, como a perda da liderança do grupo. Improvável que não haja impacto na sequência da temporada.

Os números apontam um Flamengo com 60% de posse*, mas menos finalizações certas (2×4) do que o Peñarol em pleno Maracanã. Há pela frente um Fla-Flu da semifinal do Carioca e o San José, também no Maracanã, pela Libertadores. Houve um time nervoso, incapaz de ter alternativas diante da dificuldades e sem a utilização de maior reforço na temporada. É compreensível, por vezes, explicar a Flamengada. É inexplicável, porém, a arte rubro-negra para se frustrar.

*Números do app Footstats Premium

FICHA TÉCNICA
FLAMENGO 0X1 PEÑAROL
Local: Maracanã
Data: 31 de março de 2019
Árbitro: Patricio Loustau (ARG)
Público e renda: 61.576 pagantes / 66.716 presentes / R$ 2.662.773,50
Cartões amarelos: Cuellar, Diego e Gabigol (FLA) e Formiliano, Lema, Giovanni González, Guzmán Pereira e Rojo (PEN)
Cartão vermelho: Gabigol (FLA), aos 29 minutos do segundo tempo
Gol: Viatri (PEN), aos 42 minutos do segundo tempo

FLAMENGO: Diego Alves, Pará, Léo Duarte, Rodrigo Caio e Renê; Cuellar e Willian Arão (Vitinho, 22’/2T); Everton Ribeiro, Diego e Bruno Henrique (Uribe, 41’/2T); Gabigol
Técnico: Abel Braga

PEÑAROL: Dawson, Giovanni González, Formiliano, Lema e Lucas Hernández; Brian Rodríguez (Rojo, 28’/2T), Guzmán Pereira (Lucas Viatri, 35’/2T), Gargano e Canobbio; Cristian Rodríguez e Nuñez (Gaston Rodríguez, 19’/2T)
Técnico: Diego López

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