A sinergia entre Flamengo e Maracanã é daquelas relações difíceis de explicar. Da arquibancada emana um sentimento capaz de atordoar adversários, seduzir de forma quase hipnótica quem acompanha o pulsar de uma Nação. Faz crer ser possível mudar o andamento de um partida. Mesmo naqueles de pouca fé. Maracanã e Flamengo se misturam de tal maneira que um se torna a extensão do outro. Uma massa vermelha e preta que tinge os bancos agora azuis e amarelos. E sorri. Os números são agradáveis. Em 47 jogos na Libertadores ali, quase 74% de aproveitamento. Há um porquê de se brigar pela união. Mas o destino é incerto.
O novo Maraca, modernizado e sem um tanto de seu caráter popular e sua gente, ainda abriga espaço para novas histórias. E reconta as antigas. Como no mosaico diante do Atlético-PR. Apresenta ali, ao vivo, memórias até mesmo de quem não as vivenciou. Parece contraditório. Não é. O gol de Zico contra o Cobreloa, em 1981. Foi assim, eles diziam. Será assim de novo, insistiram. Falavam, claro, da taça. Para continuar a persegui-la, o Flamengo deveria vencer. Em 15 minutos, fez o serviço. O 9 não é mais Nunes, mas lutou por cada espaço no ar até cabecear a redonda para a rede. O 10 não é um Zico, mas faz golaço, abre os braços e dá soco no ar. Por 120 vezes a arquibancada comemorou um gol do Flamengo no estádio na história da Libertadores.
Um Maracanã na competição sul-americana que já foi do Galinho, de Petkovic, de Adriano. Um estádio que, ironicamente, jamais viu Romário em ação com a camisa 11 rubro-negra em uma Libertadores. Que conta histórias alegres. Os gols de Zico contra o Cobreloa. A vitória no duelo do Imperador contra o Fenômeno em 2010, sob chuva torrencial. A maior goleada do clube na Libertadores, em 93, 8 a 2 sobre o venezuelano Minerven, com garotos como Djalminha, Marquinhos, Marcelinho ao lado dos veteranos Gaúcho e Gottardo. Que conta também tristezas. Os gols de Cabañas na maior derrota rubro-negra no estádio na competição sul-americana. 3 a 0, em 2008. Há torcedor incrédulo até hoje.
O retorno ao palco de tantas festas é incerto. A diretoria acredita ser possível repetir o acordo e voltar no dia 3 de maio, contra a Universidad Católica. Nem o memorando de intenções assinado pela Lagardére para a compra da concessão da Odebrecht é visto como grande ameaça. Os dados, no entanto, ainda rolam. Com os franceses, os dirigentes rubro-negros garantem, não tem conversa.
“Não vamos nos iludir com nenhuma jogada feita para ludibriar o Flamengo e os seus torcedores. Não tem nada de oficial. Essa situação tem de ter o apoio do Governo e isso não aconteceu. Espero que não aconteça. Tenho certeza que o Governo do Estado vai ter sensibilidade e não vai embarcar nessa aventura. Não vai entregar o maior templo do futebol nas mãos de aventureiros e atravessadores. A solução ideal é uma nova licitação, que dá mais transparência e segurança jurídica”, disse o presidente Eduardo Bandeira de Mello à ESPN Brasil.
Em 2017, o Flamengo de novo coleciona episódios para sorrir no estádio. A estreia, 4 a 0 contra o San Lorenzo, foi a melhor de todos os tempos. O Atlético-PR foi a vítima da vez. Da união do clube, Maracanã e sua torcida. Nos dois jogos deste ano 119.547 pessoas integraram a massa a pulsar na arquibancada. Gente que senta, levanta e explode a cada gol e ao apito final. Mas mesmo com as vitórias segue aflita. Não sabe se poderá fazer, de novo, do estádio a sua casa. Com suas superstições. Ter ali, a céu aberto, discussões de relação, como houve com Cirino. Deixar-se seduzir com gols e declarações explícitas de carinho, como fez com Diego. O destino é incerto. Mas há de se reconhecer. Há algo entre Maracanã e Flamengo. Só parece ser impossível, mesmo, explicar.
Campanhas do Flamengo no Maracanã em Libertadores
Ano | Vitórias | Empates | Derrotas | Aproveitamento | Gols pró | Gols sofridos |
---|---|---|---|---|---|---|
1981 | 4 | 2 | 0 | 77,7% | 17 | 7 |
1982 | 1 | 0 | 1 | 50% | 4 | 3 |
1983 | 2 | 0 | 1 | 66,6% | 13 | 6 |
1984 | 5 | 0 | 0 | 100% | 16 | 6 |
1991 | 3 | 2 | 0 | 80% | 13 | 3 |
1993 | 3 | 1 | 1 | 66,6% | 16 | 8 |
2002 | 1 | 1 | 1 | 44,4% | 5 | 4 |
2007 | 4 | 0 | 0 | 100% | 7 | 1 |
2008 | 3 | 0 | 1 | 75% | 6 | 4 |
2010 | 3 | 1 | 1 | 66,6% | 10 | 6 |
2014 | 1 | 1 | 1 | 44,4% | 7 | 6 |
2017 | 2 | 0 | 0 | 100% | 6 | 1 |
Total | 32 | 8 | 7 | 73,7% | 120 | 55 |